
Acabo de ver a notícia de que o Sítio do Picapau Amarelo ganhará mais uma adaptação cinematográfica em live action. A obra tem previsão de lançamento para 2022 e é intitulada "De Volta ao Sítio do Picapau Amarelo"...mas será que vale à pena voltar?
Logo no inicio do primeiro livro da série, o "Reinações de Narizinho", Lobato apresenta cada um dos moradores do Sítio. Dona Benta é "a mais feliz das vovós" e Nastácia é referida como sua "negra de estimação", que carregou a neta da patroa no colo.
Em outra ocasião, no livro "Caçadas de Pedrinho", o escritor caracteriza a cozinheira como "macaca de carvão", em mais uma tentativa de desumanização. Me pergunto se é mesmo interessante trazer essa história — que envelheceu tão mal — à tona novamente. Nastácia ainda se refere a Dona Benta como "sinhá".

Em todas as adaptações recentes, a maioria dos termos racistas foi removida. Mas e o contexto? Que mensagem passamos retratando histórias onde os negros apenas ocupam o papel de servidão? Sempre me perguntei qual a história de Nastácia, se ela tinha a própria família ou apenas vivia para desempenhar o papel esteriotipado de "mammy", a doméstica nata que existe para cuidar da família da "sinhá". Tio Barnabé passava por situação semelhante.
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Lobato era assumidamente eugenista, crendo numa "pureza racial", a mesma ideologia que culminou no Holocausto. No livro "Urupês", de 1918, ele disse "o caboclo é o sombrio urupê de pau podre", condenando a miscigenação, o que voltaria a fazer por diversas vezes.
Sua obra era claramente uma ferramenta de disseminação dessas ideias, "O Presidente Negro" é outro exemplo. Monteiro tentou emplacar este livro no mercado norte-americano...e até mesmo os editores estadunidenses consideraram racista e segregador (isso vindo de um dos países mais racistas e segregadores do mundo).
Em carta escrita ao amigo Godofredo Rangel, Lobato lamentou o fracasso nos Estados Unidos : "Errei vindo cá tão tarde. Devia ter vindo no tempo em que linchavam os negros".

Penso que uma solução eficaz seria que a história fosse centrada em uma família negra, deixando as características do período colonial para trás.
Conforme divulgado, o filme apresentará uma aventura inédita e também promete inserir novos personagens à história, o que poderá aumentar a representatividade no projeto. Resta esperar e torcer para que apenas o folclore e a vida no campo sejam mantidos como na obra original.
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